6 de junho de 2012

Uma Campana Alegre, IX

         Qualquer semelhança com a realidade brasileira não passa de mera coincidência transcrista por um 'singelo' escritor português do século XIX.

           "Há muitos anos que a política em Portugal apresenta singular estado:
          Doze ou quinze homens, sempre os mesmos, alternadamente possuem o Poder, perdem o Poder, reconquistam o Poder, trocam o Poder...O Poder não sai de uns certo grupos, como uma pela que quatro crianças, aos quatro cantos de uma sala, atiram umas às outras, pelo ar, num rumor de risos.
           Quando quatro ou cinco daqueles homens estão no Poder, esses homens são, segundo a opinião e os dizeres de todos os outros que lá não estão - os corruptos, os esbanjadores da Fazenda, a ruína do País!
            Os outros, os que não estão no Poder, são, segundo a sua prórpia opinião e os seus jornais - os verdadeiros liberais, os salvadores da causa pública, os amigos do povo e os interesses do País.
          Mas, coisa notável! - os cinco que estão no Poder fazem tudo o que podem para continuar a ser os esbanjadores da Fazenda e a ruína do País, durante o maior tempo possível! E os que não estão no Poder movem-se, conspíram, cansam-se, para deixar de ser o mais depressa que puderem - os verdadeiros liberais e os interesses do País!
          Até que enfim caem os cinco do Poder, e os outros, os verdadeiros liberais, entram triunfantemente na designação herdada de esbanjadores da Fazenda e ruína do País; em tanto que os que caíram do Poder se resignam, cheios de fel e de tédio - a vir a ser os verdadeiros liberais e os intersses do País.
         Ora, como todos os ministros são tirados deste grupo de doze ou  quinze indivíduos, não há nenhum deles que não tenha sido por seu turno esbanjador da Fazenda e ruína do País...
            Não há nenhum que não tenha sido demitido, ou obrigado a pedir a demissão, pelas acusações mais graves e pelas votações mais hostis...
         Não há nenhum que não tenha sido julgado incapaz de dirigir as coisas públicas - pela Imprensa, pela palavra dos oradores, pelas incriminações da opinião, pela afirmativa constitucional do poder moderador...
            E, todavia, serão estes doze ou quinze indivíduos os que continuarão dirigindo o País, neste caminho em que ele vai, feliz, abundante, rico, forte, coroado de rosas num chouto tão triunfante!"

                                                                                                                    Eça de Queirós

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